desconectividade

e o cicrano, morreu. não serei hipócrita de dizer que ele era um grande amigo meu. não, não era e nunca foi. mas o cicrano era um conhecido. um sujeito boa praça. sempre alegre, quando eu o encontrava. se não estava bebendo uma ceva, nesses cachorrões que vendem xis, geralmente com a camisa do grêmio, estava filosofando por aí. por último, estava correndo. fazendo disso, um esporte. foi assim que eu o vi pela última vez.

a vida da gente é um sopro. menos do que isso. talvez, um piscar de olhos. e no meio de tanta conectividade, tantas amizades "verdadeiras", falta tempo para dizer: oi, tudo bem? como você está? há muitos anos, não tenho rede social nenhuma. apenas isso aqui. e realmente, não me faz falta nenhuma. sabe o que é pior? poucos dias antes, a mãe do cicrano também se foi. da mesma doença. essa daí, que já chamaram de gripezinha. 

quando a água bate na bunda, -  é assim que diz o ditado? - as pessoas se assustam. hoje, esta cidade, está tomada desse mal que assola o mundo há mais de um ano. pensavam os daqui, que o vírus jamais chegaria tão longe. a ignorância, a negligência, o negacionismo. palavra que anda na moda essa última, hoje em dia. tudo isso aí, culmina com os acontecimentos. 

falando com o beltrano, sobre a triste ida do cicrano ele me disse: "agora não faltará gente dizendo que cicrano era um grande amigo. as redes sociais ficarão cheias de imagens negras, com a palavra luto bem grande escrita no meio.". verdade. e é bem assim, mesmo! e do mesmo jeito como as três palavrinhas ditas no parágrafo anterior, a hipocrisia, também faz parte do contexto. ao mesmo tempo que o beltrano me disse o que pensava, eu disse a ele: "cara, a gente antigamente sabia de cor e salteado o número do telefone de cada um dos amigos, a data do aniversário, até o número do trabalho a gente sabia".  ele replicou: "o celular, deixou a gente vadio, eu não sei o número do telefone da mãe, por exemplo". e isso é normal. é o novo, normal. mas não penso que seja o celular, o grande vilão. é essa desconectividade que se dá em virtude de toda essa falsa conectividade que existe. facebook, instagram, twitter, you tube... se você precisar de alguma coisa, algum tipo de ajuda, o comum (de quem tem) é ir para as redes sociais. conselhos, não vão faltar. mas, procurar e falar ao vivo com um amigo, ou até mesmo um conhecido, está fora de cogitação. "vamos teclar!". só que aí, "do nada", acontece algo do tipo. não é do nada que alguém morre. é a gente que simplesmente não sabia porra nenhuma sobre a vida daquela pessoa até o dado momento. por isso o choque. o baque. o "eu não acredito". 

pelo pouco que eu conheci dele, arrisco dizer que este mundo, realmente, não era para ele. e aos amigos do cicrano, os que realmente um dia foram amigos dele, fica o meu pesar. e que ele descanse em paz! 

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