a crônica de jornal

Comprei a máquina do Romeu. Estava lá atirada a coitada há mais de anos no porão da casa da mãe dele. Daquelas de escrever, de fita rubro-negra. De maleta. Estava grossa de poeira.

O problema foi achar quem arrumasse a miserável. Foi uma busca infernal por toda a cidade. Até que num fundo de vila, descobri o seu Juca. Especialista em Olivetti, e eu soube disso pelo Pedro, meu colega de repartição.

Paguei cem pila nela. Mais 70 na manutenção. Outros 30 pelas fitas. Por encomenda, é claro. Não existem mais nas livrarias. São quase um souvenir, um tipo de animal em extinção.

Quase morri de ansiedade esperando pela entrega dos Correios. Poderia ser um golpe, hoje em dia né, vai saber. Quando chegaram eu senti uma alegria do tamanho do rabo de Juno. Nunca vi! Mas é o que dizem nos seriados. Se não é do rabo dela, é do pau de Júpiter que falam. Deveriam formar uma grande dupla esses dois. Um belo casal.

Ficou tinindo. Toda lubrificada. E ao colocar a fita, um rolinho de cada lado, senti uma nostalgia... Foi como voltar no tempo. Uns 25 anos atrás. E me vi ali de frente para ela do mesmo modo que eu via, quando ainda guri, o finado pai e suas mãos grandes sobre a velha Olivetti 298 que mais parecia um canhão.

Quando coloquei a A-4 na pequena Lettera eu não soube o que escrever. Que bosta. Puta que pariu! Me faltou o tato que o velho tinha com a escrita. Resolvi tomar uma cerveja e nessa hora começou a chover. Um raio caiu do céu em algum lugar por perto. Braauaaaauuu. Tremeu a casa e terminou a luz. Um escarcéu. Que barbaridade. E a Polina deu um grito lá do quarto.

Talvez fosse um sinal. De que eu devesse pegar um pacote de velas. Foi o que fiz. E quando acendi algumas pela casa, uma ao lado da máquina, me veio um certo tino. E os dedos começaram a teclar sem mais parar na "maletinha" verde. Era um plac plac, treeec, plin que logo enchi a folha. E mais outra. Eu me senti um escrivão da Civil.

Não cabe aqui dizer o que escrevi. E me condeno por isso. Porque um dia me disseram que não se confunde "romance" com "pornografia"...

Foi um cara, metido a romancista... cronista de jornal. Ah, na verdade, um velho enrustido, isso sim. E ciumento eu imagino. Mas ali eu travei... E confesso que me deixei levar pela corneta... Fiquei meses sem escrever. Fui censurado... por eles e por eu mesmo agora.

E só voltei tantos anos depois para lhes perguntar: o que são os livros de Buk, por exemplo, ou seja, se não a mais pura e bela das putarias, tão bem escritas desse mundo e que, às vezes, são colocadas em prática por homens e mulheres quando possível? Não se trata de um romance um pouco mais quente? O amor não precisa de calor? Pra que tanto descalor? 

Comentários